Cansado de Viagens - para Marilda Confortin


para Marilda Confortin



o ônibus, o caminhão, a estrada, a paisagem
Milton Santos na minha mão
a fazenda e verdes no meu olhar
nos ouvidos “Round Midnight” e um pistão

Chet Baker vai viajando-me os sentidos
morros e mais morros lá longe, na Terra
a paisagem de uma estradinha campesina
não a da Marilda, mas uma estrada de terra

verdes vão pontilhando meu olhar
um acordeon e argentinos nos ouvidos a castelhanear
mas o rio na minha visão é inteiramente brasileiro
verdes de doer a retina vêm se entregar

quais personagens me habitam?
para onde viajo tanto
singrando a pele do planeta
pra quê? se basta-me um só canto

qualquer dia desses salto no meio do caminho
e vou, como um boi indolente, tal uma rês
com saudades de todos vocês
mas vou, mas vou, e vou...

Tonicato Miranda
Interior de São Paulo
20/10/2009.





Obrigada pela homenagem, amigo Tonicato.
Sempre te imagino pedalando, não pelas ciclovias que você cria nesse nosso brasilisão afora, mas por uma estrada de terra que te leva a uma casinha na beira de um rio, com uma latinha cheia de minhocas, um caniço de bambu, um chapéu de palha, calças arregaçadas até quase no joelho, um livro da Helena Kolody debaixo do braço, uma expressão de paz no rosto e um sorriso maroto de menino que matou a aula para pescar.

Tonicado Miranda é um poeta curitibano. Tem vários trabalhos publicado. Foi um dos mais assíduos amigos da poeta Helena Colody. Foi livreiro, dono da Ipê Amarelo. Hoje trabalha com citymarketing, desenvolvendo projeto de ciclovias para as principais cidades brasileiras.

POETRIX, CORPO ESTRANHO

corpo estranho...


cisco no olho
quando te vi fiquei cega... 
de amor.

Adoção



Adotei uma pequena Solidão abandonada, que me rondava há anos.

Eu a conheci numa madrugada insone e fria, quando ela bateu à minha porta e me pediu pouso.

Dividimos um livro, um cobertor e um pedaço de pão. Quando amanheceu ela saiu sorrateira.

Desde aquele tempo eu já abrigava um monte de ilusões malogradas, alimentava um cardume de sonhos e cuidava de um velho amor moribundo. Isso sem mencionar o esforço que eu fazia para arrastar um caminhão de esperanças perdidas, sustentar dúzias de projetos fracassados e tratar de um bando de menores problemas abandonados. Meu orfanato estava sempre cheio.

Mas, nos últimos tempos, a tal Solidãozinha começou a me visitar freqüentemente.
Aparecia em plena luz do dia e passava o fim de semana lá em casa. Quando ia embora, a pequena ladra sempre me roubava uma esperança ou uma das minhas ilusões preferidas.

Começou a trazer amigas para jantar, a folgada. Conheci Saudade, sua fiel escudeira. Interessante, faladeira, criativa. Contava cada história... e sempre me trazia uma lembrancinha de presente. Tristeza, sua outra amiga, entrava sorrateira e se escondia pelos cantos, quieta, na espreita, só esperando um velho amor morrer, para tomar seu lugar. Menina estranha, a Tristezinha. É só eu me descuidar e ela já fica toda espaçosa e se instala na minha cama.

Meus pupilos preferidos são o Silêncio e a Paz. A pequena Solidão se deu muito bem com eles.

À vezes, eu tranco todos esses filhos bastardos dentro de um baú e fujo para a rua. Vou me divertir um pouco com Alegrias Passageiras. Elas são tão lépidas e bonitas. Pena que são efêmeras como as borboletas. Em pouco tempo se transformam e terríveis lagartas, prendem a gente em seus casulos e nos devoram.

Acho que além da pequena Solidão, vou adotar também a Saudade, o Silêncio e a Paz. São bem mais fiéis e confiáveis que as Alegrias Passageiras.

Por Marilda Confortin

Poesia Confissão

Eu, pecadora, confesso:
Sou reincidente no amor.
Mas não mereço a pena
Careço é de pena, Meritíssimo!
Cristo disse:
“Amai-vos uns aos outros, como eu vos amei”
... acreditei!