Diferenças

Diferenças
Homenagem a Marilda Confortin
por Hugo de Souza Vieira

Publicado originalmente em: Prosa de um homem da capital  

Hugo e eu, no Uruguai

Elas são vaidosas. Antes do encontro, tomam banho, se perfumam, hidratam o cabelo ou até mesmo vão ao cabeleireiro enfrentar horas de escova, chapinhas e papel alumínio; conversam muito e anotam os segredos de beleza da colegas, escolhem a cor do esmalte, mas não antes de tirar a cutícula, importante não esquecer de combinar o esmalte com a roupa. Aliás, a roupa. O que vestir? Há uma roupa para cada ocasião, para a noite, para o dia, para o namorado novo, o de duas semanas, para o noivo, para o suposto jantar de negócios e até para a conquista de um novo namorado. E deita-se o guarda-roupa na cama e apesar das dezenas de vestidos, calças e camisetas, nenhuma parece cair bem.

Mas a salvação alcança a quem tem fé, uma amiga chega na hora da indecisão e resolve o problema em minutos, afinal uma verdadeira amiga, entende a aflição da outra. Esta amiga volta a sua casa e trás a roupa tão procurada. Ela põe a roupa e se sente realizada, mas ainda faltam os sapatos; parece fácil, afinal é só combinar as cores, hum...não é bem assim, os sapatos também tem ocasião para se usar, sapatos discretos, de salto alto, tamancos, sandálias, mais com a amiga para aprovar, tudo fica mais fácil e ela sai vitoriosa para o seu encontro.

Eles nem tanto. Dez minutos antes do encontro botam um tênis, uma camiseta, uma calça jeans sem pensar muito se está bonito ou não, passam um desodorante, afinal, mulheres não gostam de homens fedorentos. Olham no espelho, o cabelo parece bom, chega o amigo e algumas palavras são trocadas.

- E aí?

- Como é que vai?

- Encontro?

- Pois é?

- Então volto outra hora.

- Falou!

Ela com toda a produção chega ao restaurante e ele já está lá sentado, ela o cumprimenta com um beijo no rosto:

- Como você demorou! – comenta ele.

- É que minha amiga chegou na hora que eu estava saindo. Há quanto tempo está aqui?

- Uns quinze minutos.

Ele nem nota a produção dela e ela pensa:

"- Estes homens... só falta agora pedir para dividir a conta."

Hugo de Souza Vieira

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Hugo foi meu companheiro de viagens e bar. Dizia que não entendia nada de poesia. Que não via nada de especial numa noite enluarada. Fingia ser frio, prático e nada romântico. Me deu uma bolsa vermelha, escandalosa de aniversário. Um dia, ou melhor, uma noite dessas de poesiarada num bar chamado Vacacherri, deixei-o sozinho na mesa com uma professora chamada Fátima. Em menos de um ano estavam casados e com uma filha linda chamada Katherin. Perdi o companheiro de viagens e de noitadas, mas ganhei uma amiga e uma sobrinha. Sejam felizes, meu queridos.
Hugo, Fátima, a bebê Katherin e eu. Como é gratificante ver  a felicidades de amigos queridos. 
Deus te proteja dos meus olhares
que percorrem tua beleza.


Deus te proteja dos meus pensamentos
que te despem,
que arrancam peça a peça da tua roupa.

Deus te proteja das coisas absurdas
que gostaria de te falar.


E... que Deus me proteja e me desvie
das curvas do teu corpo,
do som sedutor da tua voz, do teu olhar.

Porque se o meu olhar cruzar com o teu...
nem Deus poderá nos proteger
da verdade que aflora pelo meu corpo.

Vaneska Pegoraro

Bula Poetrix

Os leitores deste blog, sabem que Lua Caolha é também o título do meu livro de Poetrix. Já estão carecas de saber que sou uma poetrixta convicta e que faço parte da coordenação MIP. Mas volta e meia, alguém ainda me pergunta o que é Poetrix, qual a diferença do haicai, como se faz poetrix...
Resolvi postar aqui, a nossa bula para que todos possam administrar esse bálsamo e bulir a vontade na poesia.
Só tomem cuidado com as contra-indicações!

BULA POETRIX


O hai-kai é uma pérola; o poetrix é uma pílula (Goulart Gomes)


Em 2009 o POETRIX completou 10 anos de criação. Nesse período ele obteve uma significativa propagação no Brasil, Portugal e em outros países de língua latina.


Com o objetivo de melhor defini-lo, estabelecendo critérios quanto à sua forma e conteúdo que possam orientar mais precisamente os seus autores - os poetrixtas – a Coordenação Geral do Movimento Internacional Poetrix (MIP) divulga, agora, esta BULA POETRIX, conjunto de orientações para o aperfeiçoamento e uniformização desse gênero literário.


1 POETRIX – Informações Técnicas

CONCEITO

Poetrix (s.m.): poema com um máximo de trinta sílabas métricas, distribuídas em apenas uma estrofe, com três versos (terceto) e título.

FORMAS MÚLTIPLAS

São criadas em contextos comunicativos e constituídas como derivações do POETRIX; sua elaboração tem como características básicas o dialogismo, a intertextualidade e a polissemia da linguagem. Identificadas e reconhecidas pelo MIP como Duplix, Triplix e Multiplix são mesclagens de dois ou mais poetrix que se compõem com a participação obrigatória de variados autores e com suas poéticas formando sentidos complementares entre si (individualidade-interação-universalidade).


2 CARACTERÍSTICAS DO POETRIX


2.1 O poetrix é minimalista, ou seja, procura transmitir a mais completa mensagem em um menor número possível de palavras e sílabas.

2.2 O título é indispensável. Ele complementa e dá significado ao texto. Por não entrar na contagem de sílabas, permite diversas possibilidades ao autor.

2.3 Não existe rigor quanto à métrica ou rimas, mas o ritmo e a exploração da sonoridade das sílabas é desejável.

2.4 Metáforas e outras figuras de linguagem, assim como neologismos, devem ser elementos constitutivos do poetrix.

2.5 É essencial que haja uma interação autor/leitor provocada por mensagens subliminares ou lacunas textuais.

2.6 Os tempos verbais – pretérito, presente e futuro - podem ser utilizados indistintamente.

2.7 O autor, as personagens e o fato observado podem interagir criando, inclusive, condições supra-reais, cômicas ou ilógicas (nonsense).

2.8 O poetrix deve promover a multiplicidade de sentidos e/ou emoções, não se atendo necessariamente a um único significado.


3 COMPOSIÇÃO


O POETRIX deve ser composto por ao menos um dos seguintes elementos, inspirados nas Seis Propostas para o Próximo Milênio, de Ítalo Calvino:


3.1 CONCISÃO: o mínimo é o máximo. O importante é dizer muito, falando pouco. O poetrix é uma pílula, que tem seu propósito determinado; é um projétil em direção ao alvo;

3.2 SALTO: é a metamorfose da idéia inicial, provocada no segundo ou terceiro verso da estrofe, acrescida de outros significados, permitindo uma nova perspectiva de compreensão do poetrix;

3.3 SUSTO: é o elemento inusitado e imprevisível que provoca surpresa ao leitor; é a fuga do lugar-comum, da obviedade, que desconstrói e amplia horizontes, mostrando outros caminhos, possibilidades, contextos;

3.4 SEMÂNTICA: exploração da polissemia de determinadas palavras ou expressões, permitindo a possibilidade de variadas leituras ou interpretações;

3.5 LEVEZA: jeito multifacetado de utilização da linguagem. Nesse sentido, o uso de imagens sutis deve trazer leveza, precisão e determinação ao poetrix e, com isso, provocar, no leitor, a abertura de renovadas construções mentais impregnadas de imprecisões e indeterminações, de novas possibilidades de interpretar a realidade, de desanuviar a opacidade do mundo.

3.6 RAPIDEZ: máxima concentração da poesia e do pensamento; agilidade, mobilidade, desenvoltura; busca da frase em que todos os elementos sejam insubstituíveis, do encontro de sons e conceitos que sejam os mais eficazes e densos de significado;

3.7 EXATIDÃO: busca de uma linguagem que seja a mais precisa possível como léxico e em sua capacidade de traduzir as nuanças do pensamento e da imaginação;

3.8 VISIBILIDADE: qualidade de expressar e pensar imagens, colocando visões em foco; reflexo da qualidade imagética do poetrix, em cor, sombra, contorno e perspectiva; é o substantivar da poesia;

3.9 MULTIPLICIDADE: expressão da pluralidade de possibilidades intertextuais e polissêmicas, provocando interações e criando novas formas;

3.10 CONSISTÊNCIA: através da fuga das obviedades, dos lugares-comuns, buscando expressar-se de forma original. O poetrix rompe, naturalmente, com antigos esquemas simplificantes e reducionistas e investe num sistema complexo, cujas categorias são opostas à simplicidade: a complexidade, a desordem e a caoticidade, próprias de sistemas não-lineares, capazes de realizar trocas com o meio envolvente.


4 INDICAÇÕES:

4.1 EXPLORAR O PODER DO TÍTULO,. para o qual não há limite de sílabas. Uma das grandes vantagens do poetrix é a existência do título, que habitualmente não existe no hai-kai.

4.2 MINIMALIZAR. Eliminar todas as palavras que estão sobrando. Escrever um poetrix é lapidar um diamante. Raramente um texto está pronto em sua primeira versão. É necessário, sempre, aprimorá-lo.

4.3 PESQUISAR. Uma idéia original pode ser enriquecida com informações complementares, ampliando-a em conteúdo e significado.

4.4 UTILIZAR FIGURAS DE LINGUAGEM. Em todas as formas poéticas, o uso de figuras de linguagem, metáforas, tropos e imagens enriquecem bastante o texto.

4.5 PERMITIR QUE O NÃO-DITO FALE. Evite menosprezar a inteligência e a perspicácia do leitor. O poetrix deve instigá-lo a buscar significados nas entrelinhas, a descobrir outros contextos e sentidos.


5 CONTRA-INDICAÇÕES:

5.1 EVITAR AS ORAÇÕES COORDENADAS. Um poetrix não é uma frase fragmentada em três partes.

5.2 NÃO CONFUNDIR POETRIX COM HAI-KAI. Para isso, é importante conhecer, também, os fundamentos do hai-kai, que tem suas próprias características.

5.3 CONJUNÇÕES EMPOBRECEM O POETRIX: mas, contudo, porém, todavia, não obstante, entretanto, no entanto, pois, geralmente não servem para nada em um poetrix, podendo ser eliminadas sem prejudicar o texto.

5.4 NÃO FORÇAR RIMAS. Poetrix não é trova. Às vezes pode-se dispensar completamente uma rima utilizando-se bem o ritmo, a sonoridade e a riqueza semântica das palavras.

5.5 POETRIX NÃO É PROVÉRBIO, MUITO MENOS DEFINIÇÃO. Muito menos, frase de parachoque de caminhão.


Coordenação Geral do Movimento Intenacional Poetrix




Poetrix(ando)

Brinco
de colar
pérolas

Marilda Confortin
Dois (pre) tensos poemas 
de Maurício Marques Canto JR

 nefelíbata inimputável
imputrescível
mamparrea tua veleidade
indefectível.

-***-

o cigarro é o futuro
prazer da queima poluição

medida cínica da morte
tragar funesta solidão

Entrevista com o poeta JB Vidal

ENTREVISTA COM O POETA JB VIDAL

                                        por Marilda Confortin


Conheci João Bosco Vidal em Curitiba, no Café & Cultura, onde nasceu um movimento batizado de "Quinta dos Infernos" que reunia poetas, músicos, jornalistas, artistas plásticos e outros bichos grilos. Tanto o café quanto o movimento foram devorados em menos de três anos pela massa antropofágica curitibana que insiste em contradizer Lavoisier: Aqui, nada se cria, nada se transforma.

Gaucho  de Bagé, administrador por profissão, JB Vidal atuou no meio empresarial, político e artístico cultural da cidade de Curitiba e do estado do Paraná.  Muitos dos poetas jovens que freqüentam a noite curitibana, foram influenciados pelo seu jeito irreverente de ser. 
Irrequieto, questionador, dono de um texto contundente e de uma língua ferina, sua mãe costumava aconselhar “cuidado com as más companhias, Joãozinho”. Pessoalmente acho que o Vidal  conviveu consigo mesmo por um tempo muito longo e só recentemente compreendeu o que sua mãe dizia.

Tratou de se reinventar. Mudou de residência para Santa Catarina, sem avisar ninguém e agora vive com sua mulher Rosangela numa acolhedora casa em Florianópolis, na praia dos Ingleses, onde tem a piscina mais quente e a cerveja mais gelada do sul do Brasil.

Dedica-se ao seu blog cultural Palavras todas Palavras, escreve diariamente, está com o livro de poesias “Ofertório” no prelo e realiza uma pesquisa sobre personalidades catarinenses que resultará num documentário a  ser lançado ainda este ano.

Estou passando o carnaval em sua casa. Coisa que nunca pensei acontecer. Em outros tempos, já teríamos nos “matado”. Entre uma cerveja e outra, um amigo que chega outro que sai, uma música interpretada pelo violonista GG Felix, Vidal acaricia uma costela que assa na brasa “e não é de boi nelori”, previne ele, enquanto fala sobre as raças de gado mais indicadas para um legítimo churrasco gaucho e conversa sobre literatura, arte, vida.
 Pegando emprestado um comentário do amigo escritor Ewaldo Scheleder que disse “ O Vidal está insuportavelmente melhor”, inicio a inquisição perguntando:





M: - Qual foi o motivo dessa transformação?

JB: - Não sei o que ele quis dizer com isso, eu era pior? Sob que ponto de vista? Melhorei, sob que ângulo? Criei barriga? Fiquei careca? me pareceu mais uma piada do que um pensamento filosófico. O homem nasce para evoluir em todos os sentidos. Nasce bebê e torna-se adulto. Nasce totalmente ignorante e torna-se culto. Evidentemente que é uma minoria, na questão do conhecimento...claro! a maioria continua como se fossem bebês, em razão dos sistemas em que vivem, “maria vai com as outras”, vaca de presépio. Arrastam-se pela vida sem saber do que se trata. Votam em ladrões e acham que eles são muito espertos, cultuam a beleza física como se isso fosse levar a algo mais que uma trepada. Enfim, a humanidade é uma lama que só serve ao banho de alguns poucos. Então, essa evolução do homem é que está me reinventando, me refazendo, imagino. Abandonando as carcaças do percurso, me afastando do que ou quem não me acrescenta nada, e aproximando-se mais de mim mesmo, agora, não antes como você afirmou na sua apresentação. Por fim, te digo que não foi a Ilha de Santa Catarina, foi a vida mesmo. Fiz um balanço muito dolorido, por longo tempo, acho que por três anos de crítica e autocrítica, e o resultado foi mais dolorido ainda, aí você tira lições e muda, ao mudar evolui. Nem toda mudança é crescimento, óbvio. Não foi amadurecimento, não, foi constatação da necessidade de dar um salto à frente, ascender na escala, tentar pelo menos. É mais ou menos isso, em resumo, para não ser chato. Aliás, acho que a maioria dos teus leitores, a esta altura, já clicaram noutros links rs rs

M: - Pode até ser, Vidal. Mas não vou fazer apresentação acadêmica dos poetas. Não sou crítica literária e nem escrevo para adoradores de poetas mortos. Escrevo sobre poetas vivos para pessoas que querem saber o que está acontecendo agora, nesse exato momento. Por falar nisso, como está indo o seu livro Ofertório? Conte-nos.

JB:- Esse conjunto de poemas que chamo de OFERTÓRIO, é, bem provável, o início dessa mudança. Marca um período de reflexões sobre o homem e seu mundo atual. E a partir do meu olhar, tento oferecer o que me vai na alma, ou seja ofereço as experiências dos meus sentidos e de alguns sentimentos. Sendo o mais honesto possível, ofereço-me, poeticamente é claro rs rs.

M: - Do livro Ofertório, vou antecipar para os leitores, um poema visceral, sobre o qual o escritor João Batista do Lago teceu uma longa e rica análise:

OFERTÓRIO-DOR


a dor que ofereço não foi provocada
nem apascentada por mim e a solidão
veio com a chuva, c’os raios
com os anéis de saturno, na cauda do meteoro
fez poeira de lágrimas
e instalou-se nesta podridão

soube então da dor de parir
e parido fui,
da dor da fome e fome senti
da dor do sangue e o sangue correu
em minha’lma gnóstica
a dor assumiu e sobreviveu

quero então oferecer
esta dor maior que o corpo
mais que desprezo e humilhação
mais que guerras e exploração
mais que almas aleijadas
mais que humanos em farrapas degradação

ofereço a dor do amor que amei
da partida sem adeus
da saudade sem sentir
da espera inquietante
do futuro irrelevante
da ânsia divina de morrer

Poema de JB Vidal

(...) “em qual casa ele se encarna para construir o equilíbrio para poder deblaterar sua dor? Eis aqui a questão central: antes de ser “jogado no mundo”, somos “abrigados” na “casa”. Ou seja: antes de tudo – de tudo mesmo – somos “encarnados” na mundanidade das casas. Somente a “casa”, e em especial a “casa natal”, nos fornece os elementos essenciais para o processo de aprendizagem e de apreendidade do mundo. Que imagem fenomenal, caro leitor! Ao ponto de me fazer lembrar da Alegoria da Caverna, de Platão (e traçar uma analogia, aqui e agora, sobre isso tornaria este artigo muito extenso). Quem de nós, porventura, por um instante sequer, não já projetou ou projeta a “sua” casa como “campo de concentração de segurança”? Com certeza todos! Mas, qual é a “casa” dos “sujeitos” que falam nas poesias? É a casa primeira: o corpo. É no corpo que habita a poesia. É no corpo que habita o poeta. É no corpo que a poesia é encarnada. É no corpo que o poeta é encarnado.” 

Trecho da análise de João Batista do Lago, publicada originalmente no site do poeta Vidal: http://palavrastodaspalavras.wordpress.com

M: - Lá pelos idos de 2004, participei de um encontro de poesias no Uruguai. Levei comigo vários livros e poemas avulsos de escritores brasileiros para distribuir entre os poetas estrangeiros. Um deles foi um folder de poesias do JB Vidal, impresso especialmente para o evento e muito bem ilustrado pelo artista visual RETTA. Foi disputadíssimo. O poema COMA causou arrepios entre os participantes:

COMA

nasço e inauguro em mim a trajetória da morte,
início e fim, siameses do útero à campa,
como fonte, me insurjo, resisto,
consciente de sua presença, prossigo
sepultado vivo na matéria,
com a alma esgarçada na miséria
de um momento que ela mesma desconhece,
não há passado para o início não haverá futuro para o fim,
o que será dos meus pensares?
da razão? o que ficará dos sentidos?
das agonias, dos sofreres,
dos sentimentos, penso profundos,
o que será dos meus saberes?
não me falem de exemplos,
experiências, conhecimentos,
como óbolos para quem vem a seguir,
para eles há futuro, esquecer
não me venham com alegorias cenobitas,
relações de fé-imagem, palavras-reveladoras,
crenças obtusas oferecidas em sacras mansões, não!
digam apenas que estou louco,
que me debato em trevas,
que abreviei a trajetória,
que vivo morto por querer viver depois.
 Poema de JB Vidal

 M: - Vidal, me conte como foi escrito este poema?

JB:- Teria minha cara Marilda que contar minha vida, o que seria muito monótono e sem graça. Mas, para matar um pouco da curiosidade, foi escrito numa madrugada fria (curitibana) e não levou mais que 3 minutos. Não houve correções. Como nasceu ficou. Para sua composição não houve uma razão explícita.


É... Vidal é assim. Tem hora que não se consegue arrancar mais nenhuma palavra dele, exceto uma frase como essa que define sua personalidade: ”Me odeie e eu respondo. Me ame e eu me calo”.

Já meio incomodado com minha conversa, pergunta se estou com fome, se quero mais uma cerveja, se não quero dar um mergulho, se... Brinca com Lenon - seu enorme cão akita branco e simpático - que se debruça no parapeito da janela da cozinha com as patas uma sobre a outra, igual um bêbado pedindo uma pinga no balcão. Lanço um osso para o Lenon e arrisco uma pergunta final.

M:- E agora, Vidal? Que tipo de poesia essa nova fase nos reserva? Pode mostrar pelo menos uma?

JB: - Ainda está cedo. Nem sei se já existe uma nova fase e se escrevo sob o império dela, mas realmente tenho escrito muito até porque, agora, tenho todo o tempo disponível para fazê-lo. De qualquer maneira o ambiente da Ilha me entusiasma para novas incursões, como você se referiu estou na fase de pesquisa sobre personalidades catarinenses que tenham sido, realmente, fundamentais para o desenvolvimento político, econômico e cultural do estado a partir de 1960 até os dias atuais. Este livro deverá ser lançado ainda em 2010. Penso, também, editar e jogar pelas praças e feiras, no chão evidentemente, meus 5 livros de poesia, 3 de contos e crônicas e um romance que pretendo finalizar aqui depois de 4 anos escrevendo...é pouco, mas já dá para os críticos se divertirem e manterem seus salários das editoras que compõem o famigerado “mercado editorial”.


Insisto para que me mostre uma poesia nova. Não mostra. É hora de parar com essa conversa. Convida-me para conhecer a poesia imagética que salta aos olhos nos mares do sul de Florianópolis.

Depois, gentilmente manda-me alguns textos por email, dizendo que achou nossa conversa um tanto pobre. Deixo alguns desses textos do Vidal para que degustem e espero que discordem dele quanto a pobreza. Oxalá todos os poetas fossem tão ricos quanto você, Vidal.

ETERNO     

meu corpo no teu
acende a dúvida

ser ou estar

eu!? nós!?

gozo cósmico!?

prazer em deixar-me ir
onde estás ou sejas

sou inteiro em ti

estou metade



PRISIONEIRO


nas mãos
cartas
datas
tempos
épocas
coração rítmico
arritmico
desritmico

meus lábios esmagam versos.


SANTA BOEMIA


Deus!

és o mais sábio dos poetas
pois fizestes morada no cosmos
onde é sempre madrugada!




  Vidal, eu e o violonista GG Felix, nos Ingleses - Florianópolis

Obrigada pelo dedo de prosa, Vidal. Obrigada pela hospedagem,  amiga Rosangela. Obrigada pela música, GG. 

Nos vemos por aí...

Quase poema e música

Quase

Parece que foi ontem.
Eternidade.
Ontem fez um ano.
Ou quase.

Quase morri, quando vi
nosso caso implodir:
Camicase.

Quando te vi sumir,
nas brumas de Avalon,
pensei ser o fim
― o Armagedom.
Mas, sobrevivi,
ou quase.

Teu rosto foi ficando vago,
Como a lembrança de um sonho,
num quadro.

Teu posto ainda está vago,
mas logo reponho.
Tenho um estoque de amor
guardado, novinho em folha.
Prontinho pra dar
para quem ocupar o teu lugar.

É... amor,
a vida é feita de quases
frases, fases.
Essa já passou,
ou quase.

Rafa Gomes foi fisgado por esse poema, quando eu ainda estava escrevendo, lá no Bardo Tatára. Ele pegou o rascunho da minha mão e falou: É meu! Você escreveu pensando em mim, porque acabei de acabar meu namoro. Vou fazer um reggae
Bom, na verdade eu estava escrevendo pro meu filho, que também tinha acabado o namoro, mas, quem sou eu pra discutir com o Rafinha... 
E ficou linda a música. Até ganhou um festival. Ouçam aí: 

QUASE
letra de Marilda Confortin
música de Rafael Gomes


Direção: Rafael Lopes
Direção de Fotografia: Rafael Lopes / Catarina
Edição: Rafael Lopes
Cameras: Helen / Catarina / Rafael Lopes
Roteiro: Mineiro / Rafael Lopes
Video produtora: MF Brothers
Agradecimentos: Marilda, Tatára, Mineiro, Guto Teixeira,
Daniel Peçanha, galera da "Segunda Autoral" e Isabela Freitas. 

VALEU RAFA

Morte dolorosa

Morreu em Cuiabá o músico paranaense Marco Antonio Guiraud


Marco Guiraud é pai dos meus filhos Ébano e Nayara. 
Vivemos longos e bons anos juntos. 
Nosso amor e carinho para sempre.



Deus costuma usar a solidão
para nos ensinar sobre a convivência.
às vezes, usa a raiva para que possamos
compreender o infinito valor da paz.

Outras vezes usa o tédio, quando quer
nos mostrar a importância da aventura e do abandono.

Deus costuma usar o silêncio para nos ensinar
sobre a responsabilidade do que dizemos.

Às vezes usa o cansaço, para que possamos
compreender o valor do despertar.

Outras vezes usa a doença, quando quer
nos mostrar a importância da saúde.

Deus costuma usar o fogo,
para nos ensinar a andar sobre a água.

Às vezes, usa a terra, para que possamos
compreender o valor do ar.

Outras vezes usa a morte,

quando quer nos mostrar a importância da vida.

Fernando Pessoa

  Vai em paz, querido. Cuidarei bem dos nossos pequenos. Nos encontraremos novamente, se existir o outro lado, como acreditavas.