ORAÇÃO DA VELHICE




Ó Senhor, tu sabes melhor do que eu que estou envelhecendo a cada dia.
Sendo assim, livra-me da tolice de achar que devo dizer algo, em toda e qualquer ocasião.

Livra-me, também, Senhor, deste desejo enorme que tenho
de querer pôr em ordem a vida dos outros.

Ensina-me a pensar nos outros e ajudá-los, sem jamais me impor sobre eles, mesmo considerando com modéstia a sabedoria que acumulei e que penso ser uma lástima não passar adiante.


Tu sabes, Senhor, que desejo preservar alguns amigos e uma boa relação com os filhos e que só se preservam os amigos e os filhos... quando não há intromissão na vida deles.

Livra-me, também, Senhor, da tolice de querer contar tudo com detalhes e minúcias
e dá-me asas para voar diretamente ao ponto que interessa.

Não me permita falar mal de alguém.
Ensina-me a fazer silêncio sobre minhas dores e doenças..
Elas estão aumentando e, com isso,  
a vontade de descrevê-las vai crescendo a cada ano que passa.


Não ouso pedir o dom de ouvir com alegria
a descrição das doenças alheias; seria pedir muito.
Mas, ensina-me, Senhor, a suportar ouvi-las com paciência.

Ensina-me a maravilhosa sabedoria de saber que posso estar errado em algumas ocasiões.
Já descobri que pessoas que acertam sempre são maçadoras e desagradáveis.

Mas, sobretudo, Senhor, nesta prece de envelhecimento,
peço: mantenha-me o mais amável possível.

Livrai-me de ser santo(a).
É difícil conviver com santos!

Mas um(a) velho(a) rabugento(a), Senhor,
é obra prima do diabo!
Me poupe!!!

Amém!
(Desconheço o autor. Se alguém souber de quem é, favor me comunicar)

Poesia Um brinde aos poetas



Um brinde!

Poesia é uma Flor Bela que Espanca,
fere, maltrata.
Poesia quando ataca provoca cirrose,
divórcio, taquicardia, tuberculose...
Poesia mata!
Por isso, os grandes poetas estão mortos.
Por isso, os poetas vivos são assim tão... tortos.
Só loucos, vivem a poesia em sua essência.
Em sã consciência,
a hipocrisia desta vida é insalubre,
arde feito urtiga e é mais fria
do que a vodka Maiakowski que consumia Leminski.

Por isso eu ergo uma taça e brindo
a todos os malditos poetas,
seres vis, errados
vicerados pelo avesso,
não servis,
citados,
anônimos e abominados
que rabiscam e recitam seus manuscritos
pelos botecos,
sebos,
saraus e feiras
livres prisioneiros da poesia.

Aos benditos que publicam e são lidos
e aos amaldiçoados ficam empoeirados,
empoleirados nas prateleiras,
criando teia,
esperando que um dia alguém os leia.

Aos que travestem a poesia com barro,
tinta,  efeitos virtuais,
acordes musicais
e passam pela vida despercebidos.

Um brinde aos que partem cedo
com medo de verem suas almas
sendo dissecadas por críticos estúpidos.

Poesia é de quem precisa dela, já dizia Neruda.
Se você não precisa,
não leia,
não ouça,
não toque!
Ela é como um feto:
precisa de calor e útero
e não de um fórcipe obstetra.

E mais um brinde
a todos aqueles que atuam à luz do dia,
nesse imenso palco,
de paletó, gravata, saia justa, salto alto,
e esperam impacientes a aposentadoria
para enfim, declarar seu amor pela poesia.

Aos entraram na fila errada
e estão neste mundo por engano
só para diversão dos deuses:
Não escrevem, não cantam,
não esculpem nem declamam.
Mas sentem, lêem, amam e acolhem
anonimamente a poesia em seus ventres.


Um brinde a todos os recipientes!

Cansado de Viagens - para Marilda Confortin


para Marilda Confortin



o ônibus, o caminhão, a estrada, a paisagem
Milton Santos na minha mão
a fazenda e verdes no meu olhar
nos ouvidos “Round Midnight” e um pistão

Chet Baker vai viajando-me os sentidos
morros e mais morros lá longe, na Terra
a paisagem de uma estradinha campesina
não a da Marilda, mas uma estrada de terra

verdes vão pontilhando meu olhar
um acordeon e argentinos nos ouvidos a castelhanear
mas o rio na minha visão é inteiramente brasileiro
verdes de doer a retina vêm se entregar

quais personagens me habitam?
para onde viajo tanto
singrando a pele do planeta
pra quê? se basta-me um só canto

qualquer dia desses salto no meio do caminho
e vou, como um boi indolente, tal uma rês
com saudades de todos vocês
mas vou, mas vou, e vou...

Tonicato Miranda
Interior de São Paulo
20/10/2009.





Obrigada pela homenagem, amigo Tonicato.
Sempre te imagino pedalando, não pelas ciclovias que você cria nesse nosso brasilisão afora, mas por uma estrada de terra que te leva a uma casinha na beira de um rio, com uma latinha cheia de minhocas, um caniço de bambu, um chapéu de palha, calças arregaçadas até quase no joelho, um livro da Helena Kolody debaixo do braço, uma expressão de paz no rosto e um sorriso maroto de menino que matou a aula para pescar.

Tonicado Miranda é um poeta curitibano. Tem vários trabalhos publicado. Foi um dos mais assíduos amigos da poeta Helena Colody. Foi livreiro, dono da Ipê Amarelo. Hoje trabalha com citymarketing, desenvolvendo projeto de ciclovias para as principais cidades brasileiras.

POETRIX, CORPO ESTRANHO

corpo estranho...


cisco no olho
quando te vi fiquei cega... 
de amor.

Adoção



Adotei uma pequena Solidão abandonada, que me rondava há anos.

Eu a conheci numa madrugada insone e fria, quando ela bateu à minha porta e me pediu pouso.

Dividimos um livro, um cobertor e um pedaço de pão. Quando amanheceu ela saiu sorrateira.

Desde aquele tempo eu já abrigava um monte de ilusões malogradas, alimentava um cardume de sonhos e cuidava de um velho amor moribundo. Isso sem mencionar o esforço que eu fazia para arrastar um caminhão de esperanças perdidas, sustentar dúzias de projetos fracassados e tratar de um bando de menores problemas abandonados. Meu orfanato estava sempre cheio.

Mas, nos últimos tempos, a tal Solidãozinha começou a me visitar freqüentemente.
Aparecia em plena luz do dia e passava o fim de semana lá em casa. Quando ia embora, a pequena ladra sempre me roubava uma esperança ou uma das minhas ilusões preferidas.

Começou a trazer amigas para jantar, a folgada. Conheci Saudade, sua fiel escudeira. Interessante, faladeira, criativa. Contava cada história... e sempre me trazia uma lembrancinha de presente. Tristeza, sua outra amiga, entrava sorrateira e se escondia pelos cantos, quieta, na espreita, só esperando um velho amor morrer, para tomar seu lugar. Menina estranha, a Tristezinha. É só eu me descuidar e ela já fica toda espaçosa e se instala na minha cama.

Meus pupilos preferidos são o Silêncio e a Paz. A pequena Solidão se deu muito bem com eles.

À vezes, eu tranco todos esses filhos bastardos dentro de um baú e fujo para a rua. Vou me divertir um pouco com Alegrias Passageiras. Elas são tão lépidas e bonitas. Pena que são efêmeras como as borboletas. Em pouco tempo se transformam e terríveis lagartas, prendem a gente em seus casulos e nos devoram.

Acho que além da pequena Solidão, vou adotar também a Saudade, o Silêncio e a Paz. São bem mais fiéis e confiáveis que as Alegrias Passageiras.

Por Marilda Confortin

Poesia Confissão

Eu, pecadora, confesso:
Sou reincidente no amor.
Mas não mereço a pena
Careço é de pena, Meritíssimo!
Cristo disse:
“Amai-vos uns aos outros, como eu vos amei”
... acreditei!


Causos poéticos

de Daniel Faria, para mana Marilda

Daniel e eu, conversando com JK

Causus poéticos

Seria preciso que um poeta, desses que andam na contramão do tempo, saudasse a tua história.

História construída com sangue italiano, suor, 
solidão e muitas cervejas.
Menina campeira correndo solta pelos alagados
e campos destas terras brasileiras.
Correndo atrás de boi, de vaca, de bicho, de cerca.
Correndo atrás da vida.
Amargavida.
Dura vida de moça dos interiores sulistas.
De repente a Capital. A cidade louca cheia de sons, desafios, perigos...
Que medo!
A moça para no sinal vermelho.
A cidade assusta, embaralha, desordena a visão.
Ela não sabe ainda que outra visão se anuncia.
A moça pressente as palavras. 
Mas não são as palavras.
São as PALAVRAS.
Alguma coisa lhe diz, na metamorfose do tempo, 
que outro tempo existe.
Tempo de absoluta poesia.
E a moça escuta a voz de poeta, que lá dentro já se fazia.
Uma voz que grita, berra, uiva, acaricia.
Voz antiga que  a moça nem sabia.
E a cidade agora aparece inteira 
com seus Largos e desordenados caminhos.
Sacra, profana, felizinfeliz, cinzenta e azul, verde e vício, 
templo e perdição.


Abraços do arteiro - Menestrel Daniel Faria

Daniel Faria...  como definir esse professor, poeta, músico, compositor, arteiro e amigo? Como resumir tudo o que já fizemos, vivemos, cantamos, poetizamos, trabalhamos, rimos, xingamos? Não dá, cumpadi Danié... num dá.  Nossa história tá por aí, nas bibliotecas da cidade, nos bancos escolares, nos bares, nas lembrança das pessoas, em nós. 
Valeu, mano véio!

Poesia In mezzo al mare

In mezzo al mare

sobre o poema Na Morada

 Na morada

Sobre meu poema "Na morada", recebi dois comentários poéticos que não há como não guardá-los aqui nesse meu baú virtual.



Marilda…
Por Manoel de Andrade


Chego a essa tua morada,
pra perguntar com meu canto,
pela poesia , mais nada
e pra beber seu encanto.

Aonde achas teus versos?
como nasce a inspiração?
teus apetrechos, diversos,
inscritos no coração…

Não quero a escova de dente
só a amante das poesias…
esse astral de namorada,

e que digas, a mim somente,
em que fonte te sacias
pra cantar tão inspirada.

Manoel de Andrade 20.07.09



Dona Marilda,

Por Tonicato Miranda

Quanto mais te leio mais te glorifico.
Pouco te conheço e quase já te conheço.
Este poema…Ah este poema.

O que dizer que não está dito?
Por isto mesmo agora repito:
Marilda quase te conheço.

Por que demorei tantos anos assim?
Em quais mundos paralelos voavam minhas asas?
Para não ver tuas janelas cheias de frestas.

Grande poema, Marilda.

“Lá em casa tem creme pra cabelo seco,
molhado, pixaco, loiro, ruivo e preto.
Tem óleo, toalha e escova de dente
vá que alguém de repente resolva pernoitar.”

Que coisa linda, Marilda.

Grande Abraço, palavreira.
TM

Muito obrigada meus amados Manoel e Tonicato. Minha humilde casa está sempre aberta à vocês. Emocionei...